Retiro espiritual é uma opção para quem busca o autoconhecimento
Um lugar onde o silêncio e o isolamento do mundo externo propiciam o contato consigo mesmo. Essa talvez seja uma boa definição de retiro espiritual. Independentemente da religião ou da crença que possa ser difundida no local, o objetivo desses refúgios, no geral, é um só: levar a uma descoberta mais profunda de si mesmo e a uma conexão –ou reconexão– com os valores e desejos individuais.
Na tradição cristã, a finalidade do retiro espiritual é permitir uma aproximação maior com Deus, por meio de oração e do silêncio, assim como fez o Papa Francisco quando, em março deste ano, passou uma semana em um local reservado.
“Todo jesuíta faz, anualmente, um retiro espiritual, de cerca de sete dias. Trata-se de uma busca de renovação espiritual, de uma pausa para recarregar as baterias antes de retomar a missão concreta a que a pessoa se dedica. Também pode ser um tempo privilegiado para aumentar o discernimento em relação a uma determinada situação da vida, antes de tomar uma decisão”, explica o professor Alfredo Sampaio, do departamento de Teologia da PUC-Rio (Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro).
As experiências propostas no retiro são pensadas tendo em mente um público-alvo. Por isso, ainda que a finalidade do recolhimento seja a mesma, cada estabelecimento vai organizar a sua programação de acordo com objetivos específicos. Em um retiro de meditação e ioga, por exemplo, os participantes vão experimentar as duas práticas durante a estadia. Já quando o retiro é voltado para os que seguem uma determinada religião, é comum haver palestras sobre temas relacionados ao estudo daquela doutrina.
A estudante Luciana Ferreira Cesetti, de 22 anos, é espírita e, desde os 18, frequenta um retiro que acontece durante o Carnaval, com duração de quatro dias. “Nesse período, nos dedicamos a estudar o Evangelho (uma das obras básicas do espiritismo) e também praticamos atividades esportivas e de lazer, que visam aproximar os participantes do grupo e estimular o autoconhecimento. Também aproveitamos esses dias para desenvolver trabalhos sociais voluntários”, conta.
Por reunir pessoas com interesses afins, esses refúgios também favorecem a ampliação do círculo social de quem os frequenta. “São lugares excelentes para fazer novas amizades e reencontrar velhos amigos. Às vezes, precisamos ouvir de outras pessoas que os nossos problemas e a nossa vida não são tão ruins quanto parecem e para perceber que ninguém está sozinho no mundo”, diz a assistente de marketing Heloisa de Melo Castro, de 19 anos, que frequenta retiros cristãos desde a infância.
As regras locais
Os retiros, normalmente, são lugares que favorecem o descanso do corpo e da mente. No entanto, não devem ser confundidos com hotéis ou colônias de férias. Todos eles têm suas regras e uma rotina que precisa ser seguida pelos participantes.
No geral, não é permitido usar celulares ou computadores, nem fumar, usar drogas ou consumir bebidas alcoólicas. Também não há televisão para assistir. Os horários determinados para cada atividade, inclusive para as refeições, precisam ser seguidos à risca. Em alguns deles, homens e mulheres são separados por alojamentos e não podem usar determinadas dependências do local juntos, como a área da piscina.
O preço varia dependendo da entidade que organiza e da duração do recolhimento. Para estadias de fim de semana, a faixa de preço vai de R$ 100 a R$ 400 por pessoa. O valor é usado para cobrir os custos com hospedagem e alimentação. Em muitos locais, os participantes também são convidados a trabalhar voluntariamente para manter o bom funcionamento do espaço e ajudam não só no preparo das refeições, como também a limpar os cômodos.
“No retiro, aprendemos a dividir as coisas e a viver em comunhão com o próximo. Deixamos as diferenças de lado para nos organizar e desenvolvermos atividades em grupo, como a limpeza”, explica o jornalista Renato de Farias Fontes, de 23 anos, que frequenta retiros evangélicos desde os 17. “Há horário para tudo. De manhã, há o culto e, depois, um tempo livre para diversão, que usamos para jogar bola, nadar ou ler um livro. Durante a tarde, há gincanas desenvolvidas pela liderança do grupo de jovens e, à noite, novamente nos dedicamos ao culto”, diz Renato.
Aprendendo a desacelerar
A artista plástica Renata Sussekind dos Guaranys, de 45 anos, frequenta retiros espiritualistas (que não estão diretamente vinculados a uma religião) há muitos anos e se orgulha de ter aprendido nesses locais a prática da meditação. “Meditar é essencial, pois você aprende a se olhar com mais amor. Gosto de ir a retiros porque faço uma limpeza da mente e do corpo, volto para a minha rotina sem estresse e com mais clareza dos meus propósitos”, diz.
Ela garante que pessoas com vida e mente agitadas podem se beneficiar muito da ida a um retiro, por conta da atmosfera calma e silenciosa que lhes será imposta. “Por vezes, o ser humano precisa fechar os olhos para ver mais longe e tapar os ouvidos para ouvir melhor. Um retiro pode ajudar a rever o nosso projeto de vida e permitir aprofundar a própria verdade”, diz o teólogo Evilázio Teixeira, doutor em Teologia Sistemática pela Pontifícia Universidade Gregoriana, em Roma.
A assistente de marketing Heloisa é prova disso. “Sempre sinto que volto diferente de um retiro. Tenho um dia a dia muito corrido e só o fato de passar um tempo sem pensar em nada que se relacione à minha vida cotidiana já faz com que eu saia de lá mais relaxada e com a cabeça fresca”, diz.